blog caliente.

28.2.09

Afinal não consegui.

19.2.09

amanhã conto uma coisa mais bonita, se conseguir

tenho cada vez mais medo de pessoas radicais
disse eu aos meus pais
e eles perguntaram-me "quais?"
e eu não respondi, não se responde assim aos pais

10.2.09

besugo duvidoso

Gostava de ter tido a força e a falta de medo que me chegassem para ter ficado nos Açores quando pude lá ficar.
Quase há 20 anos.
E nem sequer percebo bem porque é que vos estou a falar disto agora. Se calhar foi por ter visto o Guilherme na televisão, ele que nem deve lembrar-se de mim, sequer, eu era mais novo e era e sou pouco marcante, mas lembro-me eu dele.
Para ser eu a escrever basta-me a minha lembrança.

E vi-o, ao Guilherme, também ele vinte anos mais velho, há meia hora. Nem tanto.

31.1.09

Bonito

Um boi: o requiem

Demorou-se pouco mais de um mês.
Quase de repente, dum dia para o outro, deu-me a razão que eu, meu Deus, bem dispensava.
Na véspera deambulava ele com a mulher, no corredor, ambos de braço dado, sorridentes, "estou fino, dê-me alta". Não dei, nem sei porquê. "Amanhã, amigo, namora agora que eu amanhã dou-ta".
Já não lha dei.
Estas coisas explicam-se com outras palavras mais exactas, sei o que sucedeu, sei mesmo o que poderia ter-me acontecido se lhe tivesse dado alta e a cascata das incidências posteriores a ela se tivesse despenhado em casa dele, mas não há palavras melhores que aquelas que descrevem os factos sem os embelezarem da ciência inútil dos cultos interpretativos.
Deixou de conseguir engolir, as pálpebras caíram-lhe, ficou a ver a duplicar, em horas - mesmo com a cortisona - deixou de conseguir virar os olhos para onde eu lhe pedia, ficou incapaz de encolher os ombros, logo a seguir mexia menos dum dos lados, já mal se percebia o que dizia, aceitou a sonda nasogástrica e a minha explicação de que, parecendo tudo bem no exame feito ("o TAC"), se lhe ia fazer um outro ("a ressonância"), que ia ficar melhor, "olha, amigo, se te tenho deixado ir ontem?, já viste?", ele ainda sorria num esgar estranho e apertou-me a mão e eu disse-lhe que íamos ter de ajustar contas brevemente, vários Sportings-Portos aí vêm, "vais pagar aquilo da Taça", ele ainda tentou encolher os ombros, já não podia, como quem me dissesse, como tantas vezes me dissera antes, "lagarto é feito para perder ao sol", portista ferrenho, e eu saí dali para fora, que já a noite era de chuva longa e nevoenta e tinha fome.
Parou de respirar na madrugada seguinte, ainda o coração lhe batia bem. Depois também se lhe cansou o coração e deixou-o, finalmente, ir-se. Isto foi pouco tempo antes de eu chegar, às oito horas, ainda falei com a gente das paragens, que vinha dele cansada e derrotada dele, de maneira que entrei na manhã sabendo logo tudo, quase tudo o que suspeitara de véspera era verdade, de maneira que a comecei assim, à manhã de anteontem, a encolher os ombros - que eu isso podia, ele é que não, já desde a véspera - e fui esconder-me a dizer caralhadas murchas e a chorar por mim, para onde não me vissem, porque sei desde cedo que um médico se quer sempre composto aos olhos de quem o observa e só ele é que já não podia observar-me.

22.1.09

Esguichos de besugo

Hoje andei a ler alguns blogues. Ler mesmo, meia dúzia de textos em cada um, sem ser só entrar e sair.

Podia dizer mais coisas, porque li mais de quinze blogues, mas digo só três.

Este blogue parece-me que vai mesmo acabar: os Smiths, "Reel around the fountain", logo no dia 7 de Janeiro, com o resto dos textos já apagados ou, ao menos, invisíveis para um "clique" breve?... parece-me que vai acabar. Ou já acabou. O autor não precisa do blogue. Penso ser essa a razão do fim; se eu a tiver, é essa. É pena, porque era (é?) um blogue bonito e sintético. Difícil, isto.

O Francisco parece desiludido. E tem alguma razão quando diz (ele não diz assim, de facto, mas digo eu assim o que me parece que ele diz) que "piorámos muito". Todos. Ou quase todos nós. Mesmo os que olhávamos de baixo os blogues bons. O Francisco tem agora mais falta de tempo, o que eu entendo bem; e, nota-se, tem mais falta de pachorra. De vontade. Tem agora, pelo menos, uma vontade diferente: mais pequena, sim, mas mais orientada. O Francisco pode acabar com o blogue, tal como está - ele até o afirma, vai mudá-lo -, mas não vai sair. Não precisa do blogue, mas gosta dele.

Este, surpreende-me. Também andou (e anda quase sempre, acabei de ler) a ameaçar acabar com o blogue dele. Aliás, apaga os textos que escreve com uma frequência tão descarada que é quase sobreponível à despudorada frequência com que verificamos, a julgar pelas televisões, que Sócrates e Pedro Silva Pereira vivem - praticamente - juntos. No entanto, sabe escrever a palavra "terraplenagens". E eu, que até tenho um prontuário que a minha Mãe me deu há uns tempos, escrevia "terraplanagens" até há um ano atrás. E sou mais velho que ele. E fui ensinado a escrever "terraplenagens" por uma espécie de empreiteira. Este não precisa de acabar com o blogue porque, dá-me ideia, lhe liga pouco e é de luas novas derivado aos quartos crescentes. Mas acho que guarda os textos todos que apaga numa pastinha electromecânica que deve chamar-se "os meus documentos, foda-se".

20.1.09

E o electromecânico registou, para memória passada, presente e futura

Um electromecânico encontrou um génio que se entretinha a entrar e a sair da sua lamparina hipotecada, sucessivamente, enquanto gemia sempre de si.
Reparou, o electromecânico, que, nesse movimento mole, o génio tentava gemer cada vez mais alto e que, dada a sua capacidade de repetição, se tratava ali dum gemebundo crónico armado aos cucos e com amplificador. Dum utilizador das emoções dos outros sem as sentir ele, a menos que empiteirado sem ser até ao excesso da vómica, isto, já se pressente, por incapacidade sensitiva sóbria, mas dotado, ainda assim, da mímica manipuladora dos símios. E que parecia tenso, sempre à beira de arrebentar-se ou, por fragilidade mais provável, de o arrebentarem um dia.
O electromecânico, que vinha de fato-macaco azul escuro e iluminado apenas pela decência, atreveu-se a perguntar ao génio se aquele afã quase pavloviano de estar sempre naquela rotatividade sem outro sentido além do que lhe seria, se fosse o caso, mas não parecia, conferido pelo próprio e repetitivo movimento de "entro e saio da lamparina quando eu quero", ou seja, um exercício de "posso, portanto quero", se devia a um desgosto de amor, a um homicídio culposo (mas provavelmente involuntário) antigo, à evidente e genial estupidez característica dos moluscos com espelhos baços no quarto de banho, a alguma cornucópia antiga, à mercenária e génica - e genial - cupidez dos tarados, ou, apenas, tristemente, a uma desgraçada procura incessante do próprio umbigo; uma coisa que fosse, mais ou menos, "onde foi que deixei a minha cicatrícula, que não sei dela e preciso que dela me digam que é especialíssima, embora crie cotão?".
O génio, que, apesar de maluco e molezinho, não era desprovido daquelas colagens (ou autocolagens?) cerebrais que acontecem facilmente em gelatinas dadas à disautonomia e ao velcro fácil - reparem, quantas vezes, para compensação do vazio, se fazem colagens, se faz "velcragem"?; a sério, faz-se tanta merda em tanto cérebro, assim invadido, assim permissivo, assim permitido, assim frouxo, assim tão enrabado, assim tão... quase auto-parasitado - , respondeu ao electromecânico, numa voz aguda de varina serrana, que o umbigo era dele "e, portanto, cala-te".
O electromecânico preferiu calar-se, de facto, mas verificou que, na boquinha apanascada do génio, ali colado, ali quase velcrado na dentição maligna, havia uma espécie de letreiro que dizia "quebra-ma toda".

17.1.09

Mal, ou - ao menos - mais ou menos, este lugar continua-se

Ela caiu há dez dias, em casa, escorregou-se nela e bateu com a cabeça no chão e desmaiou, susto grande. Acordou no hospital e, da queda propriamente dita, nada resultou de nefasto: cabeça limpa.
Tinha era o que tinha, conhecia-a há vinte meses e, já por esse tempo, tinha o que tinha, chegou-me à minha vida numa rampa inclinada da vida dela, ladeira descida com travões a fundo mas sem ABS.
Equiparam-na de pijama bonito, na enfermaria. Ela mais amarela e mais inchada, por dentro dela e do pijama, do que há quinze dias.
"Vais-te...".
Foi-se.
Hoje morreu. Ia dizer "morreu-me", mas já não. Aprendo tarde, mas ainda aprendo.
Ela morreu, sim.
E morreu-lhes a eles, ao homem e aos três filhos, que lhe abraçaram o corpo e lhe beijaram a face como se as lágrimas do fim fossem loção que oleasse despedidas.
A mim, não. A mim não me morreu.
Limita-te, besugo, para já, a acompanhar as rampas inclinadas dos outros. Aprende: tu só acompanhas.
Até sentires que começas a descer a tua - olha, pode ser de repente, besugo, pode ser como foi com o Rui, o teu colega que foi hoje a enterrar, podes até nem dar muita fé da rampa, da ladeira, besugo lorpa.
E, quando isso te chegar a ti, que tenhas alguém que te chore em cima uma loção qualquer de adeus.
Um unguento quase líquido que comova, ao menos, quem estiver ali de bata branca - fardamento nobre da pobreza -, se calhar ser o caso, a acompanhar, calado, quem estiver, se vieres a ter essa sorte por destino, a ungir-te.

10.1.09

às vezes

31.12.08

a minha angola dele

Morreu. Apareceu-me hoje o nome dele, a negro, na lista das consultas de seis de Janeiro.
Gostava muito dele. Ele gostava de Angola. Gosto de Angola, então.
E Angola de mim?

30.12.08

da medida a olho

Mudem os algarismos, nem sequer são muitos. Parece-me agora é que não me aguento assim até 2010. Ou que 2009 não me aguenta assim a mim e, se for assim, tantos "assins", nessa altura, na véspera de 2010, isto vai ficar em branco.
Seja como for: assim, a ser assim, em branco de mim, ao menos, vai ficar.

29.12.08

Um boi

Temos de conversar mas é difícil porque só eu desejo essa conversa.
Tu não.
Tu, que o amas - ou não queres, apenas, que ele morra, mas acho que o amas e não queres que ele morra (amor cego e iterativo, na presente conjuntura) - não queres falar. Melhor dizendo, não queres que eu fale. Eu quero, tu não.
Fácil é chamar-te burra. Não és. Não queres, simplesmente, ouvir-me.
Fácil é chamar-te tonta. Não és. Não queres dizer o que eu penso que já sabes mas, repara, parece-me que sabes: o que se passa é que, se concordares comigo, assim chorando, é como estarmos os dois a assinar um pacto de "sabença" dele quando ele está de costas. E mais: ele nem chora. Ele anda ali.
Falamos aqui, ela, eu e os senhores, dum homem que tem um feitio difícil, uma mentação teimosa e uma ignorância granítica. Um discurso rude de duriense amável. Não sabeis o que é? Não vos explico.
Perante um cancro espalhado, um Ganges lento dentro dele - lento até ver -, nem ela (que o ama, que se ama e que, sentindo-os bem, se lhe recusa em parte), nem ele (que tem da doença uma noção complexa e difusa, como só os teimosos e os amblíopes do pensamento conseguem ter de tudo), nem eu (que acabo por nem saber como lhes dizer, nem o que lhes dizer, aliás, que sei eu também desta merda senão o que me parece?), nenhum de nós parece estar aqui muito seguro de estar a navegar em águas calmas, embora o rio siga ainda quase liso.
Sei isto: ele vai morrer e não sei quando, mas sinto que se abrevia; sei do quê: sei do que vai morrer, se antes não se acidentar. Quando é que não sei. Sinto que não demorará. Sentir é vão. Vão então para o caralho.
Sei isto: nem ele nem ela vão ser-me fáceis no declive dele, independentemente da demora.
Sei ainda isto: pagam-me para esta merda mas isto é fodido vezes demais e peço desculpa por vos deixar na dúvida sobre o facto de "se te pagassem dez vezes mais que o que te pagam era menos fodido, era, ó besugo de merda?", mas a verdade é que não, não era, era igual, era fodido na mesma.
"Era fodido - e é - mas é para ele e para ela, ó boi!" - poderão atirar-me esta pedra, aos guinchos.
Levo com ela. Em cheio no focinho, onde quiserem acertar-me.
Já não sei responder muito bem a muitas das perguntas que me fazem, quanto mais às que me faço eu, um boi destinado à lapidação.

20.12.08

Auto-emoción

Tenho seguido com invulgar atenção o problema da crise. A crise é grave, grande e, sobretudo, surpreendente. Quase tão surpreendente como a minha atenção.
Percebo que querem que eu perceba que se trata aqui - e eu falo disto da crise - duma coisa que era imprevisível e imponderável antes de acontecer. O que me dizem, o que querem que eu entenda, aquilo que querem que me penetre o bestunto, é uma ideia simples: "olha, homem, nós vínhamos por bom caminho mas, que chatice, agora aconteceu esta chatice e, efectivamente, é uma chatice; tudo azares e, eventualmente, umas vigarices: sim, umas vigarices, isso pode acontecer; mas atenção, vínhamos por bom caminho, hem?, não esquecer isto, hem?; vínhamos por bom caminho e, sobretudo, devemos fazer tudo para o manter, ao caminho, isso é que tem de ser, sim, homem? Bom."
A ideia é mais ou menos esta.
O mercado auto-regula-se. Evidentemente. É como os intestinos: até certo ponto, auto-regulam-se. Depois, pode ser preciso regulá-los. E, talvez mais barato e mais útil que regular os intestinos - já que a dada altura deixam de se auto-regular causando prejuízo ao possuidor da tripa e ao resto da malta que paga a regulação ulterior - seja uma colonoscopia anual a quem tem intestinos em risco. A Europa Cólon não me paga nada, mas faça uma colonoscopia aos 50 anos, senhor que me lê, e faça-se sócio desta agremiação sem fins lucrativos e extremamente bondosa.
O mercado livre mais famoso e lucrativo do mundo acho que chegou a ser um mercado de escravos. Nada mais livre do que ser escravo, desde que a liberdade maior seja "tenho ao menos pão". Pensem nisso se quiserem. E quando chegarem aos 50 anos, tendo pensado nisso ou não, vão meter o tubo no cu, a ver se a vossa tripa anda com potencial para se auto-regular ou se aqueles tenesmos, aqueles puxos, aquela sanguinolência no papel, aquelas coisas, são apenas do hemorroidal ou se já são causados pelos "vigaristas, e tal, do bom caminho, sempre do bom caminho, mas e tal, os tumores e isso".
Eu ainda me falta muito tempo para isso, farei 50 anos apenas daqui a muitos dias (mas menos de mil, tem graça, menos de mil dias) embora ande invulgarmente preocupado com a crise. Só não digo aqui nomes de tumores por temores de vos maçar e, além disso, por poder ir, às tantas, preso.

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